(Matéria original publicada no jornal The Guardian - Link: http://www.guardian.co.uk/technology/2012/apr/29/singularity-university-technology-future-thinkers )
Pegue os principais
pensadores do Vale do Silício e da ciência, misture com cientistas, inovadores
e capitalistas filantropos, e você terá a Singularity University – com a missão
de buscar soluções tecnológicas para os grandes desafios do mundo.
Astronauta Peter Diamandis,
cofundador da Singularity University. Foto: Andrew Brusso/ Andrew Brusso/Corbis
É o primeiro dia na Singularity University: o discurso
de abertura acabou de ser dado por um holograma. Craig Venter, um
dos primeiros cientistas a sequenciar o genoma
humano e criador da primeira forma de vida sintética, vem
em seguida. Mais tarde, veremos duas pessoas, paralisadas da cintura para
baixo, usar exoesqueletos robóticos para se levantar e andar.
No entanto, primeiro Peter Diamandis,
cofundador da Singularity University, dará nossas instruções para o dia. Sua
tarefa, diz, é escolher um dos “grandes desafios da humanidade” – a falta de
água limpa para beber, por exemplo, e elaborar uma ideia que “possa afetar
positivamente a vida de um bilhão de pessoas.”
São 9h30. Alguns de nós nem tomaram café. Há
cerca de 50 pessoas presentes e a sala foi dividida em mesas, uma para
educação, outra para pobreza, mais uma para água, e não sei onde devo me
sentar. Diane Murphy, executiva de RP da universidade, hesita por um momento e,
então, conduz-me para a mesa marcada "comida". “Olha só”, diz. “Por
que você não pega a cadeira do Ashton Kutcher? Ele só vai chegar mais tarde” (quando
ele chega, pega uma cadeira na outra mesa. O que posso dizer? Se Ashton Kutcher
não conseguir solucionar a fome no mundo, será minha culpa).
A Singularity University não é muito como uma
universidade normal, e não porque é um lugar que consegue acomodar tanto quanto
Kutcher (e onde, durante uma sessão de perguntas e respostas, alguém questiona
sobre levar a Singularity University para o gueto – esse alguém é o músico will.i.am).
Seus cursos não são credenciados e ela não
tem graduandos. A Universidade Stanford pode ter sido o berço de centenas de startups do Vale do Silício e o
epicentro de algumas de suas maiores inovações técnicas, mas a Singularity
University é uma instituição feita à própria imagem do vale: com uma ampla
rede, movimentada por um coquetel de capitalismo filantrópico e com uma noção
quase mística de seu próprio destino.
É o grupo de pensadores de elite do futuro do
Vale do Silício e seu braço de alcance global: Google e Microsoft vieram para a
conferência de fundação e deram dinheiro, a Nasa forneceu espaço no campus e no
website há uma citação de Larry Page, cofundador do Google: "Se eu fosse
estudante”, diz, “é aqui que gostaria de estar”. Seu objetivo é “formar, educar
e inspirar uma nova geração de líderes que lutam para entender e utilizar
tecnologias cada vez mais avançadas para enfrentar os grandes desafios da
humanidade.”
Portanto, não há pressão alguma, embora,
claro, a coisa mais fácil a fazer seria ignorar isso. Ashton Kutcher! (Mais
tarde, leio que ele foi chamado para o papel de Steve Jobs em um filme e tenho
uma leve suspeita de que ache que realmente seja Steve Jobs). Um bilhão de
pessoas! É o tipo de coisa em que imaginamos alguém de jaleco branco escrevendo
como evidências pouco antes de decidir nos internar. Além disso, Diamandis é o
tipo de empreendedor otimista que, como uma nação, estamos inclinados a ridicularizar
e evitar (é amigo de Richard Branson).
O único problema com isso como estratégia é
que metade das pessoas na sala realmente fez coisas que tiveram impacto
positivo sobre um bilhão de pessoas – ou, em alguns casos, até mais. Não apenas
Venter, que veio em seu jato particular; há também Vint Cerf, considerado
um dos pais da internet – trabalhou na Arpanet, antecessora
da Internet – e agora é o "principal pregador da Internet" no Google.
E Sebastian Thrun, o homem
por trás de uma das tecnologias mais recentes e potencialmente mais
perturbadoras do Google, o carro que dirige sem motorista. Também é chefe do
supersecreto laboratório X do Google, parte da empresa que a maioria dos
funcionários nem sabia que existia até o New York Times fazer uma matéria sobre ela em novembro.
Também há Elon Musk, cofundador
do PayPal e da Tesla Motors, que criou o primeiro carro elétrico do mundo e está trabalhando em um
substituto para o ônibus espacial. Na plateia estão Reid Hoffman, cofundador do LinkedIn, e Troy
Carter, estrategista de Lady Gaga. Mais tarde, Buzz Aldrin aparece. Aqui, ele é uma verdadeira celebridade. Todos
os cientistas querem tirar fotos com ele, e até Kutcher parece um pouco
acanhado. "O que acha da Singularity University?" pergunto a Aldrin.
"Sou bastante exigente comigo mesmo”, afirma, “mas venho aqui e penso
‘Deus, tenho de fazer melhor’.”
Cheio de estrelas
Apesar das poucas conquistas de Aldrin – o
segundo homem a pisar na Lua, 66 missões durante a Guerra da Coreia, dueto com
o rapper Snoop Dogg – ele tem razão. A proposta da Singularity University e sua
ideologia fundamental se baseiam em fazer melhor. Sua crença no progresso é tão
tecnológica que, às vezes, tem um quê retrofuturista dos anos 50, de carros
voadores e mochilas com foguetes.
Até o nome – que, em português, significa
Universidade da Singularidade – soa como algo saído de um livro de ficção
científica, principalmente porque saiu de um livro de ficção
científica. "The Singularity" é um termo que seu cofundador, o
escritor e futurista Ray Kurzweil, apropriou de um ensaio
do escritor de ficção científica Vernor Vinge, e, embora as definições variem,
normalmente significa o ponto no qual a inteligência dos computadores
ultrapassa a humana. De acordo com as previsões de Kurzweil, e ele tem certo
embasamento nisso, isso acontecerá em 2029.
Kurzweil é genuinamente único. É cientista,
inventor – desenvolveu um dos primeiros sistemas de reconhecimento de fala –,
autor e trans-humanista: acredita que, se conseguir viver por tempo suficiente
para a tecnologia ser inventada, poderá viver para sempre. No entanto, é mais
conhecido por ser um futurista. Previu a queda da União Soviética, o
crescimento da Internet, o ano no qual os computadores derrotariam os melhores
enxadristas humanos do mundo, o leitor eletrônico, a educação online, e muito
mais. De acordo com suas contas, 89 das 108 previsões que fez em 1999 sobre
onde o mundo estaria em 2009 estavam corretas, e outras 13 estavam
“essencialmente corretas.”
No coração de todas as previsões de Kurzweil
está a lei de Moore,
a regra pela qual o poder da computação dobra a cada dois
anos, observada pela primeira vez por Gordon Moore, que cofundou a Intel, em 1965
e previu que a tendência continuaria “por pelo menos 10 anos”. Na verdade,
continuou pelas cinco décadas seguintes e não deve acabar tão cedo. O poder da
computação mostra um crescimento exponencial: um se torna dois, que vira
quatro, que se transforma em oito e, quando colocado em um gráfico, parece um
foguete decolando.
Obviamente, uma coisa é observar isso em
semicondutores e outra é aplicar em todas as outras áreas da vida humana. Mas
se fazemos um gráfico da trajetória de carreira, plano de negócios e riqueza
pessoal de um número considerável de pessoas na sala, haveria muitas linhas em
forma de foguete, porque a lei de Moore parece descrever muito do que aconteceu
no Vale do Silício. Portanto, não é muito surpreendente que alguns de seus
moradores mais ricos e bem-sucedidos tenham adotado a ética e o espírito da Singularity
University.
Vint Cerf me diz que foi o entusiasmo de Larry
Page e seu apoio ao projeto que o estimularam a se envolver “e depois vim e
descobri que havia essas pessoas incrivelmente inteligentes aqui, discursando e
na plateia. Para mim, vir aqui é como caminhar por uma floresta de ideias."
O programa-padrão da Singularity University é
um curso de graduação de 10 semanas que custa US$ 25 mil (£15,500) e, no ano
passado, contou 2.400 pessoas se inscrevendo para 80 vagas. É a versão de um
MBA do Vale do Silício. A demanda é tanta que ela também começou a fazer
minicursos "executivos", do tipo que frequento. “Empresas bilionárias
estão surgindo da noite para o dia”, afirma Peter Diamandis. "E empresas
bilionárias estão fechando da noite para o dia”. Ou, como Mike Federle, principal
executivo de operações da Forbes me diz: "CEOs estão desesperados
para saber essas coisas. todos estão tentando descobrir o que vem pela frente."
Além disso, em vez de ser realizado no campus
da Singularity University no centro de pesquisa Ames da Nasa, no norte da
Califórnia, estamos no coração da máquina de sonhos de Hollywood, nos Estúdios da Fox em Los Angeles.
Jim Gianopulos, chairman da Fox
Filmed Entertainment, fez um curso na Singularity University e, desde então,
vem pregando sobre ela. Dada a antipatia tradicional entre Hollywood e o Vale
do Silício (copyright intelectual versus uma grande copiadora), este parece ser
um marco. As ideias estão se espalhando para a cultura de massa: o livro de Peter
Diamandis – Abundance: The Future is Better Than You Think [“Abundância:
O Futuro é Melhor do que Você Pensa”] – foi direto para a segunda posição na
lista de best-sellers do New York Times no mês passado e continua
entre os 30 primeiros.
"O poder dos computadores por dólar
aumentou trilhões de vezes desde que eu era universitário”, diz Kurzweil em seu
discurso de abertura, falando como uma cabeça holográfica em 3D da sala de sua
casa, em Boston. "Guerra, depressão, nada disso causa impacto. Ele
continua crescendo exponencialmente”. A saúde fazia progresso linear, mas “se
tornou uma tecnologia exponencial”, e com a impressão em 3D, o mesmo ocorrerá
com “o mundo das coisas físicas”.
Nosso problema com ponderar o futuro é que
nossa expectativa é "linear, não exponencial", afirma. As coisas não
vão mudar incrementalmente, e sim explosivamente. Foi isso o que chamou a
atenção de Peter Diamandis – ele leu o livro A Singularidade Está Próxima, de Kurzweil, durante uma
trilha no Chile – e o inspirou para montar a universidade
Ao final da primeira sessão de discussões,
ele nos diz para "fazer uma convenção" e pensar em algumas soluções
para nosso “grande desafio”. E então, Deus meu, “um de vocês irá falar sobre
seus achados para o restante da classe."
Estamos em sete na mesa, e a ideia é a de
que, entre nós, devemos dar uma solução – ou, sejamos ambiciosos – soluções –
para alimentar os sete bilhões de habitantes do mundo. O que Ashton diria? Minha
hipótese é a de que será um pouco como quando o senhor Gould, meu professor de
matemática da quarta série, tentava uma técnica semelhante nos anos 80 e
ficávamos sentados lendo a revista Smash Hits até ele escrever a
resposta na lousa.
Só que não, o grupo em minha mesa começa
desavergonhadamente a jogar ideias reais: é possivelmente por isso que
bilionários são bilionários e CEOs são CEOs. Eles realmente arregaçam as
mangas. “E quanto a carne artificial?” sugere Mike Federle, o que, em outro
grupo, poderia parecer um devaneio, mas aqui é mais uma observação factual.
"Poderíamos fazer um bife agora”, diz Robert Hariri, um médico que fundou
uma empresa de biotecnologia especializada em tratamentos pioneiros com
células-tronco. "Só que vai custar US$ 20 mil". Fico de boca fechada
e troco um sorriso “nem todos podemos ser gênios” com um latino simpático do
outro lado da mesa. "Ricardo Salinas", diz o crachá. O segundo homem
mais rico do México (e o 37º mais rico do mundo), descubro depois.
Há uma vantagem deliberadamente competitiva
nos procedimentos. Ela está de acordo com os pontos fortes dos CEOs e é um dos
princípios orientadores de Peter Diamandis. Ele aprendia a voar quando alguém
lhe deu um livro sobre o voo destruidor de recordes de Charles Lindbergh sobre
o atlântico e descobriu que foi uma viagem incentivada por um prêmio.
Esta teoria o levou a criar o Prêmio X, que começou como um
incentivo de US$ 10 milhões para a primeira pessoa ou empresa a criar uma
espaçonave tripulada particular reutilizável (Burt Rutan e Paul Allen, cofundador
da Microsoft, venceram em 2004 por sua SpaceShipOne). O Prêmio X lançou muito mais, o mais recente sendo
o prêmio Tricorder Qualcomm
de US$ 10 milhões para inventar um dispositivo móvel – ou "tricorder”,
como era chamado em Star Trek – capaz de diagnosticar 15 doenças.
Abundância de ideias
Há muita coisa para absorver. Não estamos nem
perto do almoço e já vimos apresentações de Craig Venter sobre seus planos de
criar biocombustíveis fabricados por microalgas: um acre, acredita, poderá
produzir 10 mil litros de óleo por ano, diferentemente do milho, que pode
produzir apenas 18. Ele acabou de receber um investimento de US$ 300 milhões da
Exxon para transformar isso em realidade.
Andrew Hessel, um dos professores de
Biotecnologia da Singularity University que está tentando abrir os tratamentos
de câncer, fala sobre como a biologia é a próxima tecnologia
exponencial. O código genético se tornará “uma linguagem de programação”.
Estamos à beira de uma mudança maciça. O acesso biológico ilegal do tipo “faça
você mesmo” já começou. “Os vírus estão vindo primeiro”, diz. “São os mais
fáceis de fazer”. Também há Vint Cerf sobre a "internet das
coisas". No futuro próximo, dispositivos conversarão entre si, afirma.
"Você está fazendo compras e recebe uma chamada. É a geladeira dizendo
‘Não se esqueça do molho marinara’."
Ele encerra seu discurso com seu sonho de uma
Internet interplanetária. “A Darpa [agência de projetos de pesquisa avançada do
departamento de Defesa dos EUA] conta com uma bolsa para desenvolver um veículo
espacial que chegará a uma estrela em 100 anos. Nas taxas de propulsão atuais,
isso levaria 65 mil anos, então precisaríamos de uma espaçonave com combustível
nuclear que possa viajar a dois terços da velocidade da luz. Só que também
temos que trabalhar a comunicação”. Parece levemente arrependido. "E ainda
não fizemos nada em escala intergaláctica."
Neste contexto, não parece tão absurdo quanto
deveria quando alguém sugere usar impressoras 3D (máquinas que montam objetos
camada por camada a partir de um arquivo digital) para imprimir impressoras 3D,
que, então, poderão imprimir um par de sapatos. Ou uma casa. Ou o jantar. “Na
verdade, isso já está acontecendo”, outra pessoa destaca. No entanto, impressoras 3D – e um protótipo de casa feita ao extrair concreto
líquido de uma “impressora” gigante já foi construído – são apenas uma das
Próximas Grandes Coisas que vêm por aí. Aprendemos sobre dezenas delas nos dois
dias seguintes. Esta é a “abundância”: a tese de Diamandis de que logo
entraremos em um mundo “pós-escassez”. Esqueça o pico do petróleo. Quem precisa
dele quando temos "15 terawatts de potência do sol chegando à Terra a cada
15 minutos"? O desafio é simplesmente coletar isso. “E estamos cada vez
melhores nisso."
Não é que isso vá mudar nosso próprio
comportamento insustentável, observam seus críticos; é que, como Craig Venter afirma,
essa tecnologia também é bastante difícil e, às vezes, não se sai tão bem
quanto o esperado. Quando ele se levanta para falar, seu microfone não
funciona. “E deveríamos estar imprimindo novas formas de vida”, diz.
Às vezes, Diamandis dá a impressão de ser,
bem, o palestrante motivacional que é. Tem uma frase em aforismos que soam como
se tivessem saído de um gerador automático de terapeuta motivador (“A melhor
forma de prever o futuro é criá-lo”, “Se você não pode ganhar, mude as regras”,
“A besteira caminha, o hardware fala"), embora tenha o dom também de
encapsular uma ideia. Uma de suas citações mais conhecidas é a de que um guerreiro
da tribo Masai com um celular tem melhor capacidade de telecomunicação do que o
presidente dos EUA tinha há 25 anos. “E se ele tiver um smartphone com Google, tem
acesso a mais informações do que o presidente tinha apenas 15 anos atrás."
Ele pode ser um tanto showman, mas tem conteúdo. Algumas das pessoas mais brilhantes e
bem-sucedidas do mundo o levam a sério. Na terça-feira passada, para dar só um
exemplo, lançou uma empresa – respaldada por, entre outros, Larry Page, cofundador
do Google, e Eric Schmidt, seu chairman
– para utilizar espaçonaves para minar asteroides na busca de minerais raros.
E ele tem o pendor do amigo Richard Branson
para o marketing. O segundo dos nossos três dias de curso termina com uma festa
no cenário de uma rua de Nova York nos estúdios da Fox. Dois paraplégicos se
levantam da cadeira de rodas para andar pelo palco em exoesqueletos robóticos e
will.i.am dá suas impressões sobre o dia: "Mudou toda a minha perspectiva
de vida, mas estou preocupado com nossas cidades do interior. Acabei de ouvir
que minha sobrinha vai ser mais burra que seu celular. Tivemos uma geração que
queria melhorar o saldo do banco, não o cérebro. Quero inspirar os jovens a ser
cientistas e engenheiros."
Há uma bela circularidade nisso. Peter
Diamandis foi criado no Brooklyn, filho de imigrantes gregos, e sua inspiração
para se tornar cientista foi a missão do Apollo, tirando diplomas em Medicina e
Biologia Molecular e, finalmente, um PhD em Engenharia Aeroespacial no MIT. A Singularity
University nem é a primeira universidade que fundou – ele montou a International Space University aos
20 e poucos anos, e ela já treinou uma geração inteira de cientistas da Nasa. É
por isso que Buzz Aldrin veio e por que outro astronauta, Dan Barry, é professor no curso de Robótica da SU (a grande
previsão de Barry: ciberconsolo. Sexo com robôs. "Você acha engraçado,
certo? Só que também sou médico especializado em reabilitação, e sexo é um
impulso humano básico que os robôs conseguirão satisfazer
para os deficientes físicos, viúvas, idosos. Vai acontecer. É bom você aceitar").
Visões assustadoras
Só que o futuro não é todo feito de sexo
emocionante com robôs e energia solar livre. O discurso de Barry também inclui
vídeos de alguns outros robôs em desenvolvimento. Se você acha abelhas assustadoras,
é porque ainda não viu o vídeo no YouTube do enxame de
quadrocópteros autônomos. Ou o dispositivo em forma de beija-flor que pode
pairar no ar e, depois, atravessar uma janela, ou o Big Dog, que parece algo
saído do filme Blade Runner, ou, na semana passada, um robô novo com
pernas que consegue fazer o que nenhum Dalek conseguiu: subir escadas.
No entanto, nenhuma dessas coisas está sendo
desenvolvida para ajudar a levar refeições ou no cuidado paliativo. São
máquinas de guerra, a maioria delas desenvolvida com fundos ou apoio da Darpa (encontro
sua chefe, a formidavelmente impressionante Regina Dugan, no banheiro feminino: não parece belicista, mas, uma
semana depois, foi anunciado que ela estava de partida para trabalhar no
Google.)
Até Dan Barry, que comanda sua própria
empresa de robótica, faz uma advertência: “Não vejo nenhum ponto final aqui. Em
algum momento, os humanos não serão suficientemente rápidos, então o que você
faz é torná-los autônomos. Onde isso termina? No Exterminador do Futuro."
Não se trata apenas dos robôs. Ou do fato de
que crianças estarão mexendo com o DNA. "Ninguém quer que seu filho seja o
primeiro a montar o vírus Ebola", diz Venter, “que tem um genoma muito
pequeno”. Mas também não parece haver nenhum caminho prático, que alguém tenha
pensado até agora, para evitar isso.
Durante a apresentação de biotecnologia, ouço
uma voz britânica se levantar e fazer uma pergunta sobre regulação. No
intervalo, converso com o dono da voz, Simon Levene, capitalista de risco
especializado em tecnologia. Está aqui, diz, “porque não há outro lugar tão
multidisciplinar. Essas coisas mudam tanto e tão rapidamente que é quase
impossível se manter a par”. Pagou US$ 5 mil pelos três dias e admite que o
preço é baixo. “Custa muito menos do que um MBA, e fiz o meu em Harvard, e
provavelmente aprendi mais aqui."
A tecnologia é impressionante, diz, mas tem a
mesma apreensão do que eu sobre a utopia tecnológica do Vale do Silício.
"Há alguns efeitos colaterais potencialmente letais, não? Toda solução tem
consequências não intencionadas. E também há questões éticas e regulatórias
muito reais a considerar que estão sendo ignoradas. O problema é que não confio
que o mercado faça isso, mas também não confio no governo. Precisa haver uma
supervisão ética internacional. Um poder simplesmente enorme está para ser
liberado. A Darpa não está aqui para brincadeira."
Uma das coisas mais assustadoras que ouço, no
entanto, não é tão ostensivamente temerosa quanto máquinas de morte autônomas. É
quando Sebastian Thrun está falando. Ele revelou o carro sem motorista na TED em
2011 – desenvolvido em resposta a uma competição realizada pela Darpa – depois
de já ter dirigido 320 mil km pela Califórnia, uma tecnologia que certamente
mudará nossas vidas profundamente.
Tem sido um ano e tanto para Thrun: ao ver
outra apresentação na TED de Salman Khan sobre seu website de educação online, a
Khan Academy, decidiu fazer
um vídeo de uma de suas aulas de inteligência artificial em Stanford e
disponibilizá-lo online. Um número impressionante de 160 mil pessoas se
inscreveram, das quais 23 mil estavam na pós-graduação. A melhor da classe era
uma deficiente chamada Melody Bliss, que trabalha em tempo integral e faz hemodiálise
três vezes por semana.
Foi suficiente para persuadir Thrun a deixar
seu cargo em Stanford e montar a Udacity,
uma universidade online gratuita, aberta a todos, que pode mudar a cara da
educação. Esta é a boa notícia. Só que ele também fundou e é chefe do Google X,
a divisão ultrassecreta de projetos especiais do Google. Está fazendo o
protótipo dos "óculos Google", de realidade aumentada, que
transmitirão a Internet diretamente a seus globos oculares, mas é o que Thrun diz
que está por vir que parece, para mim, ainda mais inovador. Dados maciços.
Sobre tudo. "Acredito sinceramente que, nos próximos 10 a 15 anos, os
computadores conseguirão capturar a experiência de uma vida inteira”, afirma.
Cada aspecto de sua vida existirá online para sempre. E não é um cientista
solitário em um laboratório de computação distante que está afirmando isso. Thrun,
só para lembrar, trabalha para o Google. A memória, aquilo que define quem
somos, que nos torna humanos, que nos diferencia intelectualmente e nos dá um
senso narrativo de nossas próprias vidas, será “terceirizada”. Este mundo, diz Thrun,
"não está muito longe". Desfrute da privacidade luxuosa de suas
próprias lembranças enquanto ainda é tempo.
Depois, Diamandis pede para os cientistas ali
darem suas melhores previsões para os próximos cinco a 20 anos. “As capacidades
de IA serão indiferenciáveis das humanas", diz Thrun. A maioria dos
empregos não existirá mais. "Haverá uma explosão”, prevê, “na arte e na
música”. Nossa definição do que é ser humano vai mudar, de acordo com Dan
Barry. Normal não será mais suficiente. Robôs estão sendo ensinados a ter
emoções. Vamos começar a ter empatia com eles.
Christopher deCharms, neurocientista que ajudou a desenvolver um
novo tipo de máquina de ressonância magnética que pode obter imagens do cérebro
em tempo real, vai mais além. "Acredito que daqui a 10, 20 ou 30 anos,
detectores de mentira irão funcionar, e farão uma retrospectiva até o momento
em que estamos. Haverá uma revolução na privacidade. A transparência chegará
até a nossos pensamentos."
Em seu discurso de abertura, Ray Kurzweil destaca
que um computador
da IBM chamado Watson recentemente havia derrotado os maiores campeões
humanos do programa de jogo da TV Jeopardy:
"E isso não é apenas através de análises estatísticas. Acho muito
significativo. É reconhecimento de padrões, que é o que as pessoas fazem. Tinha
de entender jogos de palavras e metáforas e simulações e piadas. Consegue ler
documentos de linguagem natural. Leu toda a Wikipedia – 200 milhões de páginas
de documentos. Demorou três anos, mas, ao final desse período, há uma vantagem
natural na inteligência da máquina."
A singularidade realmente está próxima,
afirma. Está a menos de 20 anos de distância. “Eu diria que seriam 30 anos
depois de 1999. O consenso, na época, era de 50 anos. hoje, está em torno de 20
anos."
Entretanto, quando envio um e-mail para Sebastian
Thrun pedindo sua opinião, ele responde: “Não é um evento único: é uma
sequência que está em andamento. Será difícil dizer quanto dela já está
acontecendo. De muitas formas, os computadores são mais inteligentes do que as
pessoas hoje."
Seu argumento é bom. "O Siri [assistente
de reconhecimento de voz do iPhone] me faz lembrar de uma mulher que ouve que
um cachorro joga xadrez e lhe perguntam ‘Não é incrível?’” diz Kurzweil. "E
ela responde ‘Sim, mas o fim de jogo dele não é muito bom’."
O fim do jogo provavelmente ficará melhor. O
mundo está mudando, de formas que nem conseguimos imaginar. Seja lá o que
estiver fazendo, a Singularity University está vendo problemas de forma
diferente. Peter Diamandis nunca se refere à superpopulação ou a recursos
limitados. Fala de “três bilhões de novas mentes entrando no mundo online” nos
próximos anos, um dialeto do Vale do Silício para “nascendo”. Essas mentes são
uma oportunidade, insiste, porque "a taxa de inovação é uma função do
número de pessoas que realmente se comunicam e isso está crescendo
explosivamente com a Internet."
Durante o almoço, converso com ele enquanto
equilibra seus bebês gêmeos sobre os joelhos, e é enfático, em vez de
tecnotriunfalista, sobre o que está tentando fazer. Acredita que as pessoas
podem fazer coisas extraordinárias. “Porque essa é minha experiência: vi gente
fazendo coisas extraordinárias."
Então, ele me pergunta: “Você não fez? Nestes
últimos dois dias?” É verdade. Fiz. Há motivos para comemorar. Só que, quando
se trata de homem versus máquina, devo dizer que aposto nas máquinas.
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